Síntese descritiva: 

Regresso a Ítaca 1 corresponde à parte inaugural do retorno a uma “Ítaca” perfumada e sublimada pelo tempo. Enquanto no belo poema – O Caminho para Ítaca – de Konstantinos Petrou Kavafis é verbalmente coreografada uma viagem metafórica, rumo à ilha prometida, neste trabalho propomos uma viagem pictórica rumo às memórias de um tempo perdido no tempo, lugar onde cabem todas as ilhas prometidas. É, assim, um texto visual introspetivo, um monólogo voltado para paisagens interiores, para sensações e emoções, instantâneos pictóricos ancorados num determinado tempo. A partir da sua reconstrução, agora iniciada, convidamos o leitor a entrar nas páginas de um diário de bordo que cartografa experiências múltiplas.

Este diálogo com o espectador traduz-se, em termos plásticos, num signo visual que apresenta um jogo de equilíbrios cromáticos e formais cujo suporte é a tela, onde relações sensíveis são estabelecidas, e onde se procura assegurar que a reunião dos diferentes fragmentos é suscetível de gerar leituras diversificadas.

Síntese descritiva: 

Inspirada na crónica “Os olhos de pedra”, a obra que apresentamos é essencialmente uma homenagem ao autor desta crónica: José Saramago. Por outro lado, é também um convite ao espectador no sentido de desenvolver múltiplas leituras a partir deste tema. 

A apreensão sincrética desta obra evidência desde logo um certo despojamento do espaço pictural. Num universo onde está presente o silêncio, onde a cor tem uma presença discreta e onde a frase inscrita é potenciadora da não linearidade e ambiguidade semântica, procurou-se favorecer uma leitura plural. Assim, tendo como foco na composição plástica ressonâncias objetivas de um busto em pedra mármore de Miguel Ângelo – o qual poderá configurar um ponto de entrada na estrutura compositiva – esta obra, não obstante a força deste elemento determinante, bem como do simbolismo do elemento vegetal, desenha um vazio plástico, um “vácuo quântico”, passíveis de gerarem distensões subjetivas no espectador, deixando em aberto diferentes saídas na leitura deste texto visual, centrado na expressividade de um rosto humano materializado de forma sensível em pedra. Até porque, como diz Saramago:

Em qualquer parte, não sei onde, os olhos da pedra estão vendo (quem sabe?) (…): o real valor do tempo e do que nele se contém, a serenidade de saber-se transitório e sorrir disso – e também a coragem de ser firme no tempo da inconsistência. Mas talvez, para tanto, seja preciso ser de pedra. Ou ter olhos de pedra. Ou ser olhos da pedra.

Síntese descritiva: 

Regresso a Ítaca 2 / In Memoriam, apresenta-se como um discurso visual que vem na sequência do universo sensível iniciado em Regresso a Ítaca 1. Na obra que agora se expõe, convocam-se fragmentos de biografia, enquanto guardiães de lembranças e afetos. Estes fragmentos, consubstanciados em formas simbólicas e emotivas, desenham espaços de memória onde, dos ecos de uma atmosfera de silêncio, emergem objetos que encerram uma história, uma recordação, um marco com raízes mentais indeléveis e indestrutíveis.

Sendo que no âmbito da relação sujeito-objeto “as coisas desenhadas abrigam um significado em branco” e, nesta medida, “recebem um significado inesperado e pessoal durante o processo interpretativo” *, espera-se que a pluralidade dos espectadores/recetores, ao vivenciarem esta experiência estética empírica subjetiva, possam nela inscrever outras paisagens contextuais, outras narrativas.

* Pombo, F. (2020). Das Coisas Belas e Desenhadas. UA Editora. Universidade de Aveiro.